Antidepressivos funcionam ou não?
Antidepressivos
funcionam?
Esse é um
assunto que frequentemente aparece na mídia, seja trazido por algum jornalista
ou por algum crítico que defende a ideia de que, definitivamente, eles não
funcionam. Dentro dos consultórios é menos comum de surgir essa dúvida, mas vez
ou outra alguém me traz essa pergunta.
Antes de responder a isso, vejamos alguns aspectos históricos. Até a década de 1950, não existiam tratamentos medicamentosos para nenhum tipo de distúrbio mental, seja para ansiedade patológica, transtornos de humor, transtornos alimentares, esquizofrenia, demência e outros. A coisa começou a mudar quando se descobriu o efeito antipsicótico da clorpromazina em 1950, o que gerou uma corrida científica para se elucidar os mecanismos neurofisiológicos que estariam ligados à esquizofrenia e na tentativa de se desenvolver medicamentos mais eficazes e mais bem tolerados
No final dos anos 1950 surgem então, os primeiros medicamentos eficazes contra quadros depressivos. A iproniazida que era uma droga usada no tratamento da tuberculose, foi relacionada com a melhora de quadros depressivos de tuberculosos em tratamento com ela. A imipramina, sintetizada para ser um antipsicótico, demonstrou não ter nenhuma eficácia como antipsicótico, mas sim como antidepressivo.
A imipramina foi então, o primeiro antidepressivo sintetizado e comercializado com essa finalidade. A única coisa que, tanto a iproniazida quanto a imipramina, demonstraram ter em comum foi a capacidade de aumentar a disponibilidade de noradrenalina e de serotonina na fenda sináptica (que separa um neurônio de outro), aumentando, portanto, a transmissão noradrenérgica e serotoninérgica.
Com o passar dos anos, muitos outros medicamentosos foram desenvolvidos, mesmo que com mecanismos de ação bastante distintos, todos eles têm em comum a capacidade de estimular receptores ou aumentando a transmissão de um ou mais do seguintes neurotransmisores: dopamina, serotonina e noradrenalina.
Com o tempo, verificou-se que vários medicamentos que tinham feito antidepressivo eram também eficazes para tratar outros problemas, tais como: o transtorno (ou síndrome) de pânico, o transtorno de ansiedade social, o transtorno obsessivo compulsivo, a enxaqueca, a cefaleia tensional, a fibromialgia, a dor da neuropatia diabética dentro outras condições.
A quantidade de estudos feitos com esses medicamentosos para suas diversas indicações é muito grande. No geral, são estudos com milhares de pacientes no mundo todo. Além dos estudos patrocinados pela indústria farmacêutica, existem também aqueles feitos pelas grandes universidades e outros institutos.
Nunca ouvi ninguém questionar a eficácia de alguns antidepressivos para a enxaqueca ou para neuropatia diabética. Na verdade, não me lembro de ouvir ninguém dizendo que medicamentos não funcionam na síndrome do pânico. Isso deve acontecer porque a melhora é tão rápida e satisfatória na maioria dos casos, que seria um absurdo questionarem.
O problema recai sobre a depressão em si. A resposta que eu tenho hoje, com base dos estudos científicos e na experiência clínica, para a questão é essa: depende. Em alguns casos os antidepressivos funcionam, em outros não.
Estatisticamente, a chance de alguém melhorar um quadro depressivo com tratamento medicamentoso é maior do que a chance de muitas pessoas melhorarem com quimioterápicos para câncer. Nunca vi ninguém questionar na mídia a eficácia dos anticolinesterásicos na doença de Alzheimer. Ora, são muito menos eficazes que os antidepressivos para depressão.
O maior problema, na minha opinião, é sobre o diagnóstico de depressão. Muitas pessoas se dizem deprimidas quando, na verdade estão tristes. A psiquiatria americana, que tornou-se referência no meio científico desde os anos 1980 contribuiu com essa confusão. Se antes a psiquiatria alemã ou mesmo a francesa não davam o diagnóstico de melancolia ou doença maníaco-depressiva para casos nos quais a etiologia parecesse ser psicogênica, agora a distinção entre tristeza e depressão tornou-se dimensional.
Isso significa que pessoas que estão muito tristes, e que com isso deixem de fazer suas atividades habituais ou durmam mal, tendem a ser diagnosticas como tendo depressão, quando na verdade, estão tristes por um motivo claro.
Um detalhe farmacológico é claro: antidepressivos não são euforizantes. Eles não melhoram a tristeza de ninguém. Euforizantes são drogas estimulantes como a cocaína ou as anfetaminas. Essas trazem uma sensação abrupta de bem estar, euforia, independente do contexto de vida da pessoa. Antidepressivos não fazem isso.
Se um pessoa estiver triste por foi deixada pelo cônjuge, ou porque um ente querido faleceu, ou porque perdeu o emprego, não há nenhum antidepressivo no mundo que a deixará feliz. Tristeza não é doença e faz parte da vida psíquica normal de todos nós. Aconselho inclusive, a assistirem ao filme da Disney “Divertidamente”, que fala de forma bastante criativa sobre a importância da tristeza em nossas vidas.
O termo depressão, que na tradicional escola psiquiátrica alemã era usado apensas para casos considerados como anormais, ou seja, como uma doença, tem sido usado de forma inadvertida nos dias de hoje.
Existem estudos clínicos com antidpressivos nos quais os resultados foram negativos? Sim, existem. E o problema, na minha opinião, recai sobre o diagnóstico. Os estudos de hoje estão sendo feitos com base em critérios diagnósticos objetivos sem se levar em conta o contexto de aparecimento do quadro. Tenho certeza absoluta, e digo isso como alguém que está no meio acadêmico, que vários pacientes que participam desses estudos de medicamentos e são diagnosticados como depressão, estão, na verdade, tristes.
A depender da estrutura de personalidade de uma pessoa, determinados eventos de vida poderão ser “depressogênicos”, ou seja causadores de depressão. No entanto, ao se avaliar friamente e objetivamente, verifica-se que, no geral, essas condições são psicologicamente compreensíveis (conforme a escola fenomenológica jasperiana) e não poderiam jamais ser consideras doenças. O termo deveria estão ser tristeza, e não depressão.
Antigamente separava-se as depressões neuróticas (de causas psicogênicas) das endógenas (de causas orgânicas). Urge que voltemos a pensar etiologicamente e não apenas sindromicamente. Essa forma de diagnosticar depressão dos tempos atuais acaba, sim, beneficando a indústria farmacêutica. Isso ocorre pois pessoas extremamente tristes acabam sendo diagnosticas como deprimidas e recebem medicamentos que não vão deixá-las alegres. Devemos lembrar que um quadro depressivo vai muito além do sentimento de tristeza e, este pode não estar presente, sendo substituído pela anedonia (que é a incapacidade de se alegrar e sentir prazer com estímulos que agradariam a pessoa). A depressão afeta o sono, o apetite, o raciocínio, a concentração, a disposição, o nível de ansiedade. Afeta também vontade e até mesmo a psicomotricidade.
Por outro lado, pessoas verdadeiramente deprimidas podem não estar recebendo o tratamento adequado, muitas vezes por recusa em se buscar ajuda, por preconceito ou por falta de acesso ao sistema de saúde.
Enfim, vocês podem me perguntar: então quer dizer que quem não melhora com antidepressivo é porque teve seu uso mal indicado? Não... não é bem assim. Mesmo quando o uso é bem indicado eles podem não funcionar. Assim como há epilépticos que não respondem a vários anticonvulsivantes e casos de câncer que não respondem à quimioterapia ou casos de pneumonia que não se curam com antibóticos, há casos de transtornos depressivos genuínos que não respondem a um antidepressivo.
O tratamento para depressão pode necessitar de aumento de doses, troca de antidepressivos associação de medicamentos, pontecialização medicamentosa, psicoterapia, exercícios físicos, controle hormonal etc.
Antes de finalizar, ressalto que, entre as causas de depressão “endógena”, está o transtorno bipolar, que é uma das principais causas de suicídio no mundo todo e cujo tratamento não se baseia no uso de antidepressivos, mas sim, no uso de sais de lítio, anticonvulsivantes e antipsicóticos.
Murilo Ferreira Caetano
Tenho transtorno bipolar e tomo carbolitium e muitas vezes me sinto muito deprimida e minha psiquiatra me mandou associar com citalopram isso é certo?
ResponderExcluirCada caso é um caso, há necessidade de se avaliar a necessidade dessa associação individualmente. Em pessoas com transtorno bipolar pode sim ser necessário, em alguns casos, a associação de antidepressivos tradicionais (como o citalopram) ao estabilizador do humor (lítio).
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